quinta-feira, 3 de maio de 2012




Quem não se comunica se trumbica!
                                A comunicação em famílias com TDAH.

- Parte 1 -

 Durante muitos anos, os sintomas do TDAH foram considerados como pertencentes a uma fase do desenvolvimento da criança. Impulsividade, extrema agitação, pouca tolerância à frustração, desatenção, impaciência, desobediência eram vistos como transitórios e passariam na adolescência, porém, com o tempo, muitas famílias foram se dando conta de que tais sintomas persistiam. 
Em geral, essas crianças e adolescentes  apresentam grande dificuldade de frear e inibir seus impulsos,  assim, exigem muita atenção e energia dos pais, podendo provocar o esgotamento físico e mental daqueles que as cercam. Muitos pais experimentam um estresse e uma ansiedade constantes, o que os afastam de uma boa avaliação sobre sua própria conduta e a de seu filho. Não raro, vemos mães irritadas ao extremo, algumas vezes certas do seu descontrole sobre o filho e, consequentemente, tomadas pela frustração e o sentimento de impotência, pois por mais que elas  apliquem medidas disciplinares aprendidas durante toda sua vida, e a das de outras mães, nada surte efeito com o filho. Somem-se a esse quadro as frequentes reclamações feitas pela escola em razão do mau comportamento da criança e/ou o baixo rendimento escolar.

Não há pai nem mãe que aguentem tal pressão!!

ALTERAÇÕES ASSOCIADAS AO TDAH

Então, o que fazer, neste caso?
Não há resposta definitiva ou única para essa pergunta, porém, cabe lembrar a complexidade de diagnosticar e tratar o TDAH não somente pelos sintomas primários de desatenção ou hiperatividade, mas, sobretudo, pela  alta frequência de comorbidades psiquiátricas  apresentadas pelos pacientes.[i]

E o que são essas tais comorbidades? São outros transtornos psiquiátricos associados ao TDAH. Estudos clínicos sobre o TDAH indicam que entre 50% a 80% dos casos apresentam alguma comorbidade, sendo a mais frequente o Transtorno Desafiador Opositivo (TDO) que se caracteriza por um persistente comportamento negativista, hostil, desafiador, desobediente observado em crianças de idade escolar, principalmente nas interações com  adultos e figuras de autoridade.  

É importante lembrar que quando é temporário, o comportamento opositivo faz parte do desenvolvimento normal da criança e até aumenta na adolescência. O processo de adolescer (entrar na fase da adolescência) é marcado pela finalização da fase infantil e pela busca da conquista da independência e da autonomia, ficando muitos dos valores da família excluídos do processo. Nesse momento, o jovem fica mais confuso com os novos papéis que lhe imputam e rebelde diante das figuras de autoridade, ele questiona e contesta as regras e os limites em busca da própria identidade, e a comunicação entre os pais e filhos pode ficar bem difícil.
No entanto, com o tempo, essa rebeldia típica da idade passa e é esse dado que diferencia a crise da adolescência  do Transtorno Desafiador Opositivo, que é persistente, causa prejuízos importantes na vida escolar, social e familiar, e deve ser diagnosticado por médico.   


FORMAS DE COMUNICAÇÃO EM FAMÍLIA

Estudos afirmam que há três formas de comunicação parental:

1)      Comunicação aberta, onde todos se sentem à vontade para manifestar seus sentimentos e questionamentos, visando ao compartilhamento e orientação de conduta;

2)      Comunicação superficial, onde  os jovens não confiam na receptividade dos pais que se mostram resistentes à chegada da adolescência de seus filhos. Esses pais constantemente exigem provas da responsabilidade do filho, porém, não estão abertos a um diálogo sincero de modo a orientar o jovem em suas demandas e aceitar suas limitações;

3)      Comunicação fechada que é marcada pelo peso da autoridade e a ameaça dos pais.


Nas duas últimas formas de comunicação, predominam os assuntos cotidianos sem espaço para os sentimentos dos jovens. Deve-se acrescentar que pesquisas indicam que a dificuldade de comunicação é bem  maior com os filhos do que com as filhas.

Todas essas informações são importantes e compreensíveis quando usamos a lógica racional, entretanto, no cotidiano familiar e emocional elas desaparecem e dão lugar a um relacionamento estressante em decorrência de uma comunicação problemática, marcada por irritação, gritos, afrontas, castigos, ameaças.


O QUE FAZER?


Creio que a primeira medida é considerar a possibilidade de que os tradicionais padrões de comportamento e as clássicas medidas disciplinares podem não funcionar com seu filho. Pessoas com o diagnóstico de TDAH, em geral, se sentem muito estimuladas num ambiente de confrontos e conflitos, incentivando as discussões acaloradas, os enfrentamentos violentos, os gritos, podendo chegar até à violência física. Assim, é fundamental que os pais façam uma sincera avaliação de seus padrões e modelos de comportamento e se abram para novas reflexões e alternativas, lembrando-se sempre de entender as características do filho e jamais compará-lo com os outros.

No relacionamento familiar, penso que o principal é:

Ø  Conhecer honestamente seu filho;
      Ø  Não esperar dele o que ele não pode oferecer por causa dos sintomas principais do TDAH;
      Ø  Ouvi-lo sempre com muita atenção;
      Ø  Proporcionar ocasiões nas quais ele se exponha sem medo;
      Ø  Ter sensibilidade para perceber o momento adequado para que ele converse com você;
      Ø  Não repreendê-lo impulsivamente quando ele relata alguma debilidade ou conta algo inesperado;
      Ø  Criar um clima de confiança e apoio;  
      Ø  Respeitar os momentos de silêncio do seu filho.

 Podemos pensar que nossos filhos nos contam tudo, mas temos que saber que não o fazem, pois eles buscam preservar a própria intimidade, o que faz parte do processo de independização. 


A ARTE DA NEGOCIAÇÃO

Com respeito à comunicação, um dos recursos que oferece melhor resultado é a negociação, que ajuda a criança a ter responsabilidades e entender que o mundo funciona à base de trocas. A negociação possibilita à criança abandonar sua posição infantil em que recebe imediatamente tudo o que deseja, e a preparar-se para tolerar as frustrações tão comuns no mundo adulto. Nesse momento, a criança começa a dar valor e a ter necessidade de corresponder aos benefícios dados pelos pais e pela sociedade.

No entanto, negociar não é tarefa fácil!! Principalmente em família, quando todos estão habituados a uma linguagem de gritos, ameaças e castigos fica mais trabalhoso promover uma mudança, mas não é impossível.

No próximo texto, escreverei sobre a Arte da Negociação, oferecendo orientações que podem ajudar a melhorar o relacionamento com seu filho.

Aguardem!

Arnete de Almeida Faria
Fonoaudióloga
Rio de Janeiro



A reprodução deste texto é permitida com a condição de que a fonte seja citada.




[i] Dificuldades no diagnóstico de TDAH em crianças. Isabella G. S. de Souza, Maria Antônia Serra-Pinheiro, Didia Fortes, Camilla Pinna. J. Bras. Psiquiatr. 56, supl 1; 14-18, 2007